História e Epistemologia da Física em Contexto

Diversos autores chamam atenção para como o ensino de ciências se beneficia do ensino de história da ciência e de uma visão epistemológica mais crítica.

Epistemologia da Física é, de maneira bem simplificada, o estudo da construção desse campo de conhecimento. Se você aprendeu em algum lugar que física é sobre fazer experimentos imparciais e a partir daí encontrar “a verdade” sobre o universo através de lógica, de acordo com muitos pesquisadores não é exatamente isso que a prática científica aponta. A Física é uma atividade humana, e como tal está sujeita a contextos históricos, sociais, políticos, tecnológicos e culturais.

Orientei dois PIBICs nessa linha sobre física em filmes, séries e animes, com as estudantes Geovana Sant’Ana e Maria Clara Cruz. Basicamente o objetivo é analisar através de exemplos como utilizar esses produtos culturais para aproximar estudantes da física. NÃO foi um PIBIC sobre fazer continhas matemáticas em cenas (“calcule a velocidade do carro na cena tal”, isso não), como muitas vezes esses recursos são utilizados no ensino.  Se vocês quiserem ver a palestra que elas deram na SECITEC de 2021 clique aqui. Estamos interessados em questões mais conceituais, como os termos científicos aparecem, como ideias físicas são representadas, e até como a noção de ciência e da prática científica é retratada. Esse PIBIC é mais adequado para quem é bem fã de filmes ou séries, porque envolve assistir e reassistir coisas com olhar crítico.

Dentro dessa linha de história e epistemologia da física, faço parte de um grupo de pesquisa com os professores Geraldo Witeze e Rangel Godinho do câmpus Anápolis e a professora Camila de Vasconcelos do câmpus Luziânia onde investigamos como os estudantes veem a relação entre ciência e religião. Eu particularmente defendo que ciência deve ser abordada sim em sala de aula, para trazer a cultura do estudante para dentro da escola e poder trabalhar a partir dela, e também para incentivar a tolerância e a possibilidade de diálogo. Embaso essa visão a partir de uma perspectiva teórica freiriana.

Também terminei um PIBIC com a estudante Bianca Scherer que investigou essa relação a partir de exemplos históricos da física. Por exemplo, há o mito de que a igreja quase jogou Galileu na fogueira e que odiavam a ciência, mas a verdade é bem mais complexa e interessante. Hoje em dia a teoria do Big-Bang é odiada por muitos religiosos, mas ela foi em partes criada por um padre, e no início os cientistas não gostavam dela justamente por parecer muito religiosa (“como assim um universo que não existia e de repente existe? Isso tá parecendo religião!”). ).

Além desses PIBICs, tem várias outras coisas que caberiam dentro dessa grande linha “História e Epistemologia da Física em Contexto“. Alguns temas que penso em trabalhar se tiver alunos interessados:

  • O impacto dos conceitos sobre física quântica na sociedade, no ensino e na saúde (por exemplo, pessoas que recusam tratamento médico com argumentos de que tudo que você precisa é vibrar na frequência do universo ou qualquer loucura assim).
  • História sobre a descoberta da radiatividade, sua utilização na saúde e os riscos (tenho um grande amigo que é físico médico e trabalha no Hospital de Base, ele poderia ajudar).
  • Como foi a perseguição a físicos na época da ditadura. Esse projeto buscaria materiais como biografias de físicos da época, e tentar compilar suas histórias e contextualizar a realidade da pesquisa em física no Brasil na época.
  • A polêmica de Otto Hahn: há muita especulação sobre o comportamento do físico Otto Hahn em ter ficado na Alemanha durante o período nazista enquanto seus colegas eram perseguidos, e de não ter atribuído à física Lise Meitner colaboração na descoberta da fissão nuclear. Eu tenho um pouco de curiosidade em vasculhar artigos que tenham explorado os motivos para isso. Necessário leitura em inglês
  • A Lei de Snell-Descartes: a lei que explica a deflexão de um raio de luz ao mudar de meio, sempre estudada no ensino médio, possui polêmicas de autoria bem interessantes. Para alguns autores Descartes “forjou” suas conclusões, já sabendo qual tinha que ser o resultado. O trabalho de Snell foi divulgado só 100 anos mais tarde de sua suposta publicação, por um conterrâneo (Huygens). Discutir essas controvérsias no ensino médio em conjunto com a disciplina de filosofia e sociologia é uma excelente maneira que trabalhar questões do que é fazer ciência.
  • A hegemonia da física Newtoniana, o conceito de espaço absoluto e a realidade ou não das forças inerciais. Pode ser interessante estudar a mecânica relacional de Koch-Assis como um contraponto a essa hegemonia.
  • Tem pouco mais de 100 anos que a humanidade descobriu, através de evidências bem embasadas, que estamos em uma única galáxia em um universo de centenas de bilhões de outras. Me interessa estudar o processo de descoberta das galáxias (e a Via-Láctea como uma delas) e como isso impactou o mundo (obras culturais, influências na religião, etc.)

Essas foram só algumas ideias de temas. Se você tem algum outro tema, pode sugerir também!